Um Diário Russo
✍️ John Steinbeck
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O ano é 1947 e a cortina de ferro começa a dividir a Europa em duas (capitalismo no oeste e comunismo no leste). Numa época onde jornalismo e propaganda estavam interligados, John Steinbeck e Robert Capa decidem ver in loco como é a vida na União Soviética. Logo no início do livro Steinbeck coloca de forma clara como eles se sentiam com o jornalismo americano: “Andávamos deprimidos, não tanto com as notícias como com a forma como eram dadas. […] Um homem sentado a uma secretária em Washington ou Nova Iorque lê os telegramas das agências e reformula-os de acordo com o seu próprio quadro mental e dá-lhes um título. Aquilo que muitas vezes lemos como notícia não é mais do que a opinião de um entre meia dúzia de especialistas sobre o que essa notícia significa.”
O objetivo da viagem era fazer um relato o menos “político” possível. O foco não era discutir a nascente Guerra Fria, militarismo ou coisas do gênero. Objetivo era conhecer o povo soviético e saber o que pensavam e como viviam. Steinbeck produziu uma literatura de viagem mesclada com foto jornalismo e documentário. Apesar da obra se chamar “Um Diário Russo”, o autor também visita a Ucrânia e a Geórgia. Pelo caráter apolítico da obra, Steinbeck sabia que iria apanhar dos dois lados o espectro político: Sabemos que este diário não vai agradar à esquerda ortodoxa nem à direita boçal. A primeira vai dizer que ele é anti-russo,a segunda que é pró-russo. Superficial é,sem duvida,e não podia ser de outra maneira. Não temos conclusões a tirar,a nao ser que o povo russo é como todos os outros povos do mundo. Alguns são certamente maus,mas na sua grande maioria são muito boas pessoas.”
Temos de tudo um pouco no livro: a vida em Moscou, tanto sob o ponto de vista dos russos quanto dos correspondentes estrangeiros que moravam lá, a vida rural na Ucrânia, a Geórgia e suas paisagens incríveis, o culto de personalidade a Stálin, dentre muito mais coisas. Há pitadas de humor, principalmente referentes a burocracia soviética e ao próprio convívio entre Steinbeck e Capa durante a viagem. Steinbeck até dedica um capítulo inteiro do livro às “reclamações” de Capa em relação ao seu companheiro de viagem.
O livro também tem partes muito sérias, como uma em que Steinbeck mostra basicamente o mesmo que Orwell mostraria 2 anos mais tarde em “1984”, a existência de um “Ministério da Verdade” que reescreve a história: “No que toca à história da Rússia, Trotski deixou de existir, e aliás nunca existiu. E um tipo de metodologia histórica que nós não conseguimos compreender. É a história como gostaríamos que tivesse sido, e não como foi. […] Para os jovens russos, porém, Trotski nunca existiu. Para as crianças que entram no Museu Lenine e aí veem a história da Rússia não existe Trotski, nem bom nem mau.”.
Leitura recomendadíssima para quem quiser conhecer um pouco dos costumes da União Soviética no pós-guerra.