Memorial do Convento

✍️ José Saramago

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Este romance histórico escrito por José Saramago passa-se no século XVIII, tem três histórias que correm em paralelo e que duram algumas décadas.

A primeira história centra-se na corte de Dom João V. O rei está com dificuldades em gerar um herdeiro e aconselhado por um religioso resolve fazer uma promessa. Se conseguir gerar um herdeiro vai erguer um convento franciscano majestoso em Mafra. Esta linha da narrativa vai se focar nos “bastidores” da coroa portuguesa, nos seus problemas financeiros (há uma parte na história onde os assessores do rei falam abertamente que as riquezas das colônias servem apenas para retardar o colapso financeiro) e também na política. Um dos episódios narrados é a “Troca das Princesas”, onde as monarquias portuguesa e espanhola fazem uma casamento duplo para selar a paz. A Infanta espanhola Mariana Vitória de Espanha casa-se com ao herdeiro do trono português, José e a Princesa Bárbara de Portugal casa-se com o príncipe Fernando de Espanha. Há também a menção ao “noivado” fracassado da princesa Bárbara com o rei Luis XV, de França.

A segunda história é do casal Baltasar e Blimunda. É sem dúvida um dos casais mais emblemáticos da literatura portuguesa. Baltasar é um soldado que perdeu uma das mãos na guerra contra os espanhois no Alentejo e regressou a Lisboa para recomeçar a vida. A família de Baltasar é de Mafra. Baltasar conhece Blimunda num auto-de-fé em que a mãe de Blimunda é uma das hereges condenadas pela inquisição por causa de seus poderes sobrenaturais. Blimunda também revela a Baltasar que possui um poder sobrenatural que ocorre em noites de lua e quando está em jejum. Baltasar e Blimunda acabam se mudando para Mafra onde Baltasar é contratado para ajudar na construção do imenso convento.

A terceira história é a do Padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão e sua invenção, a passarola. O padre Bartolomeu é protegido do rei D. João V e convenceu o monarca a lhe dar dinheiro e ceder uma quinta para construir a passarola. O padre fica amigo de Baltasar e Blimunda que o ajudam na construção do engenho. O poder sobrenatural de Blimunda terá um papel fundamental no sucesso da empreitada.

A construção do convento é quase uma história a parte. A descrição da complexidade da obra é muito bem feita e o episódio do transporte de uma enorme pedra de mármore desde Pero Pinheiro até Mafra é impressionante. Há ali muito esforço e sofrimento humano (e animal também - os milhares de bois foram fundamentais para carregar as pedras).

O final do livro é surpreendente e não vou dizer mais nada para não dar spoiler a quem ainda não leu. O livro recebe esta nota relativamente baixa mais pelo facto de Saramago não conseguir se conter nos seus “rants” anti-religião. Todos sabemos que Saramago é ateu e, acima de tudo, anti-católico mas creio que este excesso de intervenção prejudique um pouco a fluidez da história. Este é o livro mais antigo que li do Saramago e é sem dúvida o mais “militante”. Acho que ele suavizou um pouco o tom e passou a ser menos “on the nose” a partir do “Ensaio sobre a Cegueira” (PS: não li “Caim”). De qualquer forma, recomendo a leitura.