Reading in the Brain: The New Science of How We Read

✍️ Stanislas Dehaene

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Uma leitura incrivelmente densa a respeito da neurociência da leitura. Stanislas Dehaene é um neurocientista especializado em aprendizado. Eu já havia lido o seu livro “How we Learn” que é um grande ‘tour de force’ no processo de como o ser humano aprende (com algumas comparações interessantes com os neurônios das redes neuronais).

Neste livro, especificamente, Dehaene foca-se na leitura. Como ele diz na introdução é algo paradoxal que um cérebro primata como o do ser humano tenha uma inclinação para a leitura. Qual a razão deste fenômeno, uma vez que a escrita foi inventada há apenas alguns anos? O cérebro de um leitor contém uma área especializada no reconhecimento de caracteres escritos e isto é, em termos evolutivos, impossível de acontecer em um punhado de milhar de anos. Dehaene descarta a hipótese de um “designer inteligente” uma vez que há várias imperfeições neste circuito cerebral especializado na leitura. Dehaene vai apresentar neste livro a hipótese que ele chama de “neuronal recyclimg”.

O livro explica com riqueza de detalhes como o ser humano lê, o percurso feito pelos caracteres desde que são vistos pelo nosso olho, levados até a retina e a rota até os circuitos cerebrais. Aprendemos aqui que o nosso sistema visual é algo incrível. Ele consegue tempo filtrar diferenças que são irrelevantes para a leitura e amplificar as pequenas diferenças entre palavras muito similares mas com significados completamente diferentes. A quebra da palavra em morfemas, grafemas e fonemas nos é explicada é como essas unidades fundamentais acabam sendo importantíssimas nas duas rotas existentes para extrairmos o significado da palavra (a rota fonologica e a rota léxica).

Para explicar o centro de leitura cérebro (chamado de brain letterbox no texto em inglês), Dehaene faz um imenso tour pelo cérebro humano, pela neurociência e faz análises de casos de lesões cerebrais nesta região (e como elas afetam a leitura). É uma parte de leitura difícil, principalmente no meu caos que li no Kindle e fica difícil ir e voltar várias vezes no texto. Depois temos a parte com vários estudos com macacos, onde podemos ver muita coisa da letterbox.

Uma das partes mais interessantes do texto é quando Dehaene nos diz que os sistemas de escrita existentes possuem características comuns e são todos compatíveis com a brain letterbox. No fundo o nosso cérebro condicionou o processo de criação da escrita (os símbolos e alfabetos têm traços muito “naturais” para o nosso cérebro).

Outra parte que vale muito a pena ler é a respeito do processo de aprender a ler. Dehaene mostra como o cérebro de uma criança é preparado para a leitura e que o processo já começa dentro do útero. As crianças começam com a rota fonologica e quando vão crescendo, a rota léxica vai sendo consolidada. Aqui temos a constatação de que um cérebro analfabeto é incapaz de reconhecer fonemas. E falando em fonemas, Dehaene não mostra que o método fônico para aprendizado de leitura é cientificamente comprovado como o melhor (tanto em termos de neurociência quanto em termos pedagógicos). Também vemos que há uma grande desconexão entre o sistema educacional e o que sabemos através da neurociência sobre o processo de aprendizagem

O livro finaliza com capítulos que tratam de problemas na leitura: a dislexia e o problema de leitura espelhada. São dois capítulos muito interessantes, principalmente o capítulo da dislexia, onde Dehaene mostra que o diagnóstico de dislexia não é uma “sentença de morte”.

A leitura é um resultado da evolução e teve um papel fundamental na explosão cultural da humanidade. O nosso córtex pre-frontal, chamado de “Máquina de Turing primitiva” por Dehaene também foi fundamental para esta explosão, uma vez que graças a ele conseguimos chegar à escrita, gerando um ciclo virtuoso.

Não é uma leitura fácil mas foi proveitosa pois aprendi muita coisa a respeito deste órgão incrível que é o nosso cérebro.