A Fórmula Preferida do Professor
✍️ Yōko Ogawa
Tags: yōko-ogawa , japan , fiction , lang-pt , woman
Uma história surpreendente pela forma como a autora trata o tema da matemática e da memória. A narradora deste livro é uma mãe solteira que trabalha como empregada doméstica. Ela faz parte de uma agência que a designa para atender a um cliente considerado especialmente difícil. A ficha revela que nove empregadas anteriores foram substituídas a pedido dele.
O cliente é um professor de matemática recluso. Ele sofreu um acidente em 1975 que teve como consequência a incapacidade de guardar novas memórias por mais de 80 minutos. Para contornar o problema, o professor anda com diversos papeis pendurados na roupa como se fosse uma “cola”. O professor é completamente fascinado pela matemática e pelos números e sempre consegue achar um significado matemático especial numa data de aniversário ou no tamanho do sapato. A propósito, a forma como a autora explora a paixão do professor pela matemática é excelente. Conceitos como números primos, números amigos e números perfeitos surgem de maneira tão fluida e natural na narrativa que até mesmo os leitores menos entusiasmados por matemática se encantam (como é o caso da própria narradora, que representa esse olhar leigo e curioso).
Eu também achava curioso como o Professor utilizava com frequência e sem titubear a expressão “não se sabe”. A falta de conhecimento não era algo vergonhoso, mas uma placa informativa que apontava o rumo para se chegar a uma nova verdade.
A fórmula de Euler era um cometa a brilhar nas trevas. Um verso de poema gravado nas paredes de uma caverna escura. Comovida por essa beleza, eu guardei a folha de papel novamente na carteira.
A relação entre o professor, a empregada e “Raiz”, o filho da narradora, que ganhou esta alcunha do professor devido ao formato da sua cabeça que lembrava o simbolo da raiz quadrada, também foi contada de uma forma bem comovente e envolvente. Tanto as dificuldades iniciais em lidar com a perda de memória do professor quanto a crescente empatia da narradora e de seu filho são descritas com sensibilidade. Apesar desta componente dramática, a leveza da narração torna a leitura prazerosa. O baseball também aparece na história. Além de ser o mais “matemático” dos esportes com suas inúmeras estatísticas, ele funciona como um ponto de conexão entre o professor e “Raiz”, fortalecendo ainda mais os laços de amizade entre eles.
O Professor tratava meu filho como se fosse um número primo. Para ele, as crianças eram indispensáveis a nós, adultos, da mesma forma que os números primos constituíam a base de todos os números naturais. Acreditava que era graças às crianças que ele existia naquele momento.
Uma rápida e comovente leitura que recomendo, independentemente da apetência do leitor pela matemática.