La orgía perpetua

✍️ Mario Vargas Llosa

Tags: mario-vargas-llosa , essays , lang-es , nobel , peru

La Orgía Perpetua é um extenso tratado (quase 240 páginas) sobre Madame Bovary, o romance mais famoso de Gustave Flaubert. Logo de início, o que mais me surpreendeu foi descobrir a admiração quase devocional de Mario Vargas Llosa por Flaubert, em especial Madame Bovary.

O livro é dividido em três grandes ensaios. O primeiro deles mistura crítica literária com memórias biográficas: Vargas Llosa relata como a sua formação como escritor foi influenciada por Madame Bovary. Esta primeira parte é mais um declaração de amor de Vargas Llosa do que uma análise técnica, apesar de haver algumas menções a estética e forma da escrita de Flaubert. Discordo frontalmente da maneira como Llosa interpreta Emma Bovary. Ele a vê como uma heroína trágica que ousa desafiar as convenções e a mediocridade da vida burguesa, enquanto eu a percebo como uma personagem egoísta e fútil.
Pero no es sólo el hecho de que Emma sea capaz de enfrentarse a su medio —familia, clase, sociedad—, sino las causas de su enfrentamiento lo que fuerza mi admiración por su inapresable figurilla. Esas causas son muy simples y denen que ver con algo que ella y yo compartimos nuestro incurable materialismo, nuestra predilección por los placeres del cuerpo sobre los del alma, nuestro respeto por los senddos y el insdnto, nuestra preferencia por esta vida terrenal a cualquier Las ambiciones por las que Emma peca y muere son aquellas que la religión y la moral occidentales han combatido más bárbaramente a lo largo de la historia. Emnra quiere gozar, no se resigna a reprimir en sí esa profunda exigencia sensual que Charles no puede satisfacer porque ni sabe que existe, y quiere, además, rodear su vida de elementos superfluos y gratos, la elegancia, el refinamiento, materializar en objetos el apetito de belleza que han hecho brotar en ella su imaginación, su sensibilidad y sus lecturas.

Para se ter uma ideia do nível do seu admiração por Flaubert, Vargas Llosa confessa ter mudado de opinião sobre alguns autores ao descobrir o que pensavam sobre Flaubert.

O segundo ensaio é, para mim, o ponto alto do livro. Aqui, Vargas Llosa se transforma num verdadeiro detetive literário. A partir de um minucioso trabalho com a correspondência de Flaubert, ele responde a uma várias perguntas:

- Qual foi a inspiração para Madame Bovary? O que tem de real e o que tem de fictício?
- Qual foi a rotina de Flaubert durante o processo de escrita do romance? Praticava exercícios? Teve amantes?
- Quais foram as principais fontes de que Flaubert bebeu para ter a inspiração para escrever Madame Bovary?
- Que problemas de saúde teve Flaubert ao longo dos anos de escrita do livro?
- Flaubert usou elementos autobiográficos em Madame Bovary?

Também nesta segunda parte, Vargas Llosa se debruça em aspectos bem específicos da obra: humanização de objetos versus objetificação dos humanos, a relação entre amor e dinheiro, a própria Emma Bovary como uma mulher de atitudes consideradas bem masculinas para a época.

Numa vertente mais técnica, Vargas Llosa fala sobre como Flaubert lidou com a forma de narrar a passagem (ou não) do tempo e de como o autor também utilizou uma narração polifônica quase imperceptível ao leitor. E sobre a narração, vale destacar que Flaubert antecipou o fluxo de consciência que se tornaria emblemático no início do século XX.

O terceiro ensaio discute a influência de Madame Bovary na literatura moderna. Uma questão que gera discussão até hoje é: Flaubert foi um autor realista ou romântico? Apesar de Flaubert ser considerado pela crítica como um pioneiro do realismo, sua obsessão pela forma fez com que ele criticasse o movimento, uma vez que Flaubert considerava que muitos escritores realistas desdenhavam do aspecto estético do texto. Ainda assim, sua influência sobre gerações posteriores, inclusive sobre autores de correntes diametralmente opostas, é inegável.

Um ponto negativo da edição que li (Debolsillo, em espanhol) foi a inclusão de trechos de cartas de Flaubert no francês original, sem tradução. Isto tornou a leitura mais trabalhosa uma vez que precisei ir várias vezes a internet traduzir as frases, o que, por consequência prejudicou um pouco a experiência de leitura. Por isso, apesar de achar o conteúdo excelente e recomendar a todos os admiradores de Flaubert e Madame Bovary, dou 3 estrelas (o conteúdo em si merece 4 ou 4,5).